segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Tome Isto ao Coração: Do Fim ao Fim



...e é sob os aturdidos efeitos de 2012, que o Dimenti lança o seu mais novo trabalho - Tome Isto ao Coração - um dos produtos artísticos deste clima apocalíptico em que vivemos este ano, que nunca se conflagra ou deflagra de fato. Um fim que nunca vem, e que tem frustrado todas as datas e prognósticos proféticos.


Tome Isto ao Coração não é alentador, mas tão pouco pessimista. É profundo, mas não é denso. É engraçado, mas não é uma comédia. É triste, mas não é deprimente. Dizem eles: o fim de um ciclo; me pergunto: da borboleta ou da lagarta?


Meu amor
O que você faria se só te restasse esse dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?


...o espetáculo principia com uma atmosfera onírica esquizóide com flash-backs e déjà vus,  para logo depois assumir um tom documental, mas um outro - a tal documentalidade metafísica a que se referem os espiritualistas, de que na hora da morte, veremos a nossa vida projetada como um filme - e por esta senda, "os Dimentis" enveredaram para o seu rito de passagem, neste que tende a ser o último espetáculo deles como "o" grupo.

O roteiro da peça adquire uma não linearidade muito própria aos efeitos de livre associação do inconsciente, nesses processos que mimetizam uma transmigração da vida para a vida; é no intervalo exato entre uma e outra, que se situa "Tome Isto ao Coração" - um vazio que para deixar sê-lo, é preenchido de memórias.

Mas para o Dimenti, "memórias" são tags:


(e +; e +; e +)


Andava pelado na chuva
Corria no meio da rua
Entrava de roupa no mar
Trepava sem camisinha
O Último Dia - Paulinho Moska 


Pulsão. Às vezes de forma autobiográfica ou noutras metabiográfica, os atores e atrizes mergulharam nas profundezas abissais do "Id" - ou da "Criança", como poderiam arguir os Transacionais - trazendo ao palco fetiches, fantasias, desejos; um pouco daquele hedonismo inerente às origens primitivas do Teatro. Uma volta ao princípio, antes do fim.

Este conteúdo bacante, serve de material para jogos cênicos e diálogos francos sobre questões psicanalíticas da ordem do nosso cotidiano contemporâneo: o medo de envelhecer sozinho/a; angustias suicidas; insatisfação com o próprio corpo; os prazes enfêmeros; o gozo; o gozo; o gozo;

Um espetáculo voluptuoso e fúnebre, mas não num sentido adolescente byroniano démodé; mais para a resignação festiva da "impermanência" que Kurosawa aborda no último capítulo do seu "Sonhos".

À tempo, não foi aleatoriamente que mencionei a "Criança" há pouco. Em Tome Isto ao Coração, o Dimenti volta a citar a infância como rumo - ou prumo - estético, e me questiono aqui: se aquela perseguida por Picasso; ou a infância da "delicadeza perdida".

Enfim... tudo é básico em Tome Isto ao Coração, do "pretinho" do figurino aos sentimentos, aos sorrisos e às reflexões. Básico, sincero e honesto, ou como diria Edna 'E' Mode: Simples, Elegante e Bárbaro!

Não estamos alegres,
é certo,
mas também, por que razão
haveríamos de ficar tristes?
O mar da história
é agitado.
As ameaças
e as guerras
havemos de atravessá-las,
rompê-las ao meio,
cortando-as
como uma quilha corta
as ondas.
Maiakóvski
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